CORRIDA DE
SUBMARINOS
Os submarinos como todos sabem
são vasos de guerra que possuem como principal característica a possibilidade
de navegarem sob as águas. Mesmo com esta característica desvantajosa e sendo
disputadas à noite, as corridas de submarinos tinham um grande número de
espectadores no Rio de Janeiro.
Historicamente a primeira citação
a uma Corrida aparece num samba popularizado pelo Jorge Veiga, onde ele conta
que estacionou na Praça Paris para mostrar o Pão de Açúcar à Conceição. Isto
deve ter sido antes do Aterro, provavelmente lá por 1953.
Os casais estacionavam seus
carros em qualquer lugar da orla. Existiam é claro lugares mais procurados,
mais centrais, de acesso mais fácil. Em frente ao Country, no Arpoador, entre a
Farme e a Teixeira de Mello, Barra da Tijuca ou
Praia Vermelha.
Embora não existissem regras
rígidas, alguns lugares tinham características próprias. Na Praia Vermelha por
exemplo, patrulhada por soldados do exército, não era possível grandes
expansões. Era ideal para uma despedidazinha, principalmente se a moça morava
no Flamengo, Botafogo ou adjacências.
A Barra era um deserto completo.
Uma vez um companheiro da PUC, recostou a cabeça na janela para olhar o céu ou
respirar um pouco, sei lá. Eis que surge uma velha louca que morava por lá,
passa um acorda no seu pescoço e começa a apertar. Sorte que sua amiga era
esperta saiu do carro rápido e começou socar a velha que afrouxou o aperto e
ele escapou. A turma ficou uns tempos sem aparecer por lá.
Outro problema sério da Barra era
na saída. Freqüentemente alguém atolava na areia e era necessário auxílio Os
mais experientes tinham uma corda junto à caixa de ferramentas, sempre passava
um par de almas boas que davam uma mão. De qualquer forma os reboques do
Touring e do Automóvel Clube, faziam um bom dinheiro nas noites de sabado.
Até na Lagoa existiam corridas. É claro que com submarinos adaptados para menores profundidades e percursos. Ficava mais ou menos em frente à Hípica. Ali foi um dos últimos locais onde foi possível assistir a uma boa corrida.
Até na Lagoa existiam corridas. É claro que com submarinos adaptados para menores profundidades e percursos. Ficava mais ou menos em frente à Hípica. Ali foi um dos últimos locais onde foi possível assistir a uma boa corrida.
Tinha também o Drive In. O
primeiro ficava em São Conrado, exatamente onde hoje localiza-se o Hotel
Nacional. Com a construção do Hotel o Drive mudou-se para o alto do Joá,
improvisado no pátio de um restaurante desativado. Quem não se lembra da
mensagem escrita em letras imensas na parede branca: NAMORE MODERNAMENTE.
As bebidas eram colocadas em
badejas presas na porta do carro. De vez em quando podia-se observar um copo de
alguma coisa deslocando-se vagorasamente até cair, impulsionado pelo movimento
ritmado do automóvel.
Colocar as bebidas dentro do
carro também estava longe de ser uma solução. De repente um abraço mais
violento, um movimento mais brusco e lá se ia o copo de gin tônica pelos ares.
Valia tudo nas corridas. Um bem
comportado início de namoro, ao som de fitas cuidadosamente gravadas para a
ocasião. O amor completo louco e desvairado com sérios riscos de distensões
musculares, em função do pequeno espaço disponível. Rompimentos calmos ou
turbulentos. Às vezes parava-se de namorar para ouvir o quebra pau no carro
vizinho.
Os lançamentos da indústria
automobilística, ainda engatinhando, eram saudados por todos. Ah! Os bancos
reclináveis, quantas possibilidades... O tanque de água para limpar o
pára-brisas, capaz de remover a maresia que se acumulava por fora do vidro. O
desembaçador que fazia serviço similar por dentro, dissipando os vapores do
amor. E aquelas alças estratégicas que alguns juravam ser de grande utilidade.
Uma dificuldade que nunca foi
resolvida era a maldita alavanca de câmbio. O freio de mão resolvia-se com uma
almofadinha. Para a alavanca o jeito era engrenar uma primeira para incomodar
menos. Era comum na hora de ir embora ligar-se o carro com a marcha engrenada
Outra dificuldade tecnológica eram
as buzinas que permaneciam ativadas quando desligava-se o motor. De vez em
quando na calma da noite era aquele susto.
Marca registrada do Rio de
Janeiro— que outro lugar no mundo teria a criatividade de inventá-las?— as
corridas começaram a perder sua assistência por diversos motivos sociais e
econômicos. A revolução dos costumes cristalizada na década de sessenta, banaliza
um pouco o sexo e desvaloriza o “scherzo”. Os espanhóis no Rio, percebem a
tendência, interagem acelerando o movimento. Proliferam os motéis bem montados
e seguros.
Nossos insensíveis prefeitos vão
criando, jardins e meios fios inescaláveis, impedindo a chegada dos veículos
até a orla. A cidade descaracteriza-se. Hoje a violência urbana encoraja os
pais a convidarem os namorados e namoradas ao pernoite.
Acabou-se o intimismo, aquela
gostosa cumplicidade a dois, os encalhes nas areias da Barra, o susto provocado
por um guarda que queria dinheiro, o banho de gin tônica, o mico da buzina
tocando no meio da noite e aquele último cachorro quente no Geneal.
Dissemos adeus ao mistério e a
magia que envolvia tudo isso. A adrenalina foi embora, canalizada para os
esportes radicais.
para Evaldo, um aficionado
Rio de Janeiro 10
de Dezembro de 1995