quinta-feira, 2 de setembro de 2010

ALIENIGENA MIMETICO

Você conta que vai para praia fim de semana. Ah! Vai com aquele motoqueiro horroroso. Ta bom. O que você não sabe ainda, é que eu também vou.

Mago e bruxo, alienígena multifacetado, mimético, pluri mórfico
e amorfo, multi cromático, andrógino quando convém, poeta e fotógrafo, espadachim e metafísico... Vou junto sem ser notado.

Num estalar de dedos transformo-me num ser de fibras finas e macias, adoto cores vivas, amarelo, azul e toques de um forte laranja, pronto sou um belo tecido e me incorporo em uma magnífica canga que você enrola na cintura num nó caprichoso. Visto teu corpo por cima do biquíni branco, aperto tua cintura, envolvo teus quadris com suavidade e roço tuas coxas sem cessar enquanto caminhas.

Estamos na moto enfim, e agora, numa mágica total e com uma graça sem par, sou a canga e o vento, represento um dos meus inúmeros papéis múltiplos que já levaram o público ao delírio mais de uma vez. Agora sou um vento meio passivo que vou despertando com a velocidade da máquina. Acaricio teus cabelos, fundo-me com
a canga e a faço drapejar. Consigo soltar-me um pouco e alcanço a parte alta de tua coxa esquerda. Acaricio-te nas curvas para direita e me afasto um pouco, só para te dar saudades, nas curvas para a esquerda. Subo por teus braços nus e enfuno por trás, a
tua camiseta branca, deslizo por tuas costas como uma cachoeira ao contrário e sopro tua nuca. Você se arrepia.

Chegamos na praia.Você está feliz. Tira a camiseta e me remove com cuidado. Com teus pés macios faz um montinho de areia. De repente, num processo de pura metamorfose quântica, me transformo em grãos de areia, sou eu que penetro pelos vãos de teus dedos, que faço cócegas nas plantas de teus pés. Agora numa cambalhota sensacional me incorporo de novo na canga, me estendo sobre mim mesmo, enquanto areia, e espero teu corpo. Você senta sobre minhas múltiplas formas e se ajeita. Conversa animada com os amigos enquanto eu continuo ventando no teu rosto e revolvendo teus cabelos, agora faço três papeis.

Deitas de costas, se ajeita outra vez e me esmaga. Sinto teu corpo e me deformo toda, meus grãos se acertam acomodam-se às tuas curvas perfeitas. Às vezes sinto uma vontade imensa de te envolver, incorporo o vento que me sopra. Como canga, levanto-me de mim como areia e me enrosco em tuas coxas roliças. Você me acaricia e acomoda-me sobre a areia de novo. Você já percebeu minha presença múltipla, despertei tua bruxa. Agora você sabe que essa loucura toda só podia ser obra minha.

Incorporo um quarto papel, sou o sol agora, aqueço-te e escureço tua melanina fazendo-te mais morena e dourada. O eu vento me ajuda, ele sopra e eu pico teu corpo com meus raios fulminantes, te deixamos feliz, pois esse contraste de calor e frescor te encanta que eu sei. De repente pensas na camada de ozônio que esta indo embora, uma ruguinha aparece no teu rosto. Discreto, procuro uma nuvem, escondo-me um pouco.

Sintetizo-me, viro teu suor começo escorrer vagarosamente por teu corpo. Tua perna toca na areia, eu me grudo em mim mesmo. Uma mancha branca na pele morena. Marco você, como uma mordida.

Você levanta e entra no mar, concentro-me numa das minhas melhores performances, penetro tuas locas, tuas tocas, e fendas. Limpo meus papeis anteriores... Não sou mais nada, sou só água agora, água viva e louca. Arrebento-me em ondas, envolvo teu corpo, minha espuma te cobre... Você agora é toda minha... Você nada dentro de mim, te possuo inteira... Escorro por todo teu corpo numa caricia impossível de ser igualada, leve, mas total, completa, móvel, inteira e insistente. Firme e amorosa.

Quando você sai, o vento e o sol enciumadíssimos me expulsam do teu corpo... Ah eles não conseguem remover o meu sal, agora sou teu gosto.

Volta para a canga deita e de bruços abraça o montinho de areia. Eu me amoldo ao teu colo, me amoldo ao teu corpo, você se aconchega. A praia esta mais vazia agora, o sol mais manso, o vento mais calmo. Agora somos só nós dois você e a terra.

Agora leia tudo de novo, com atenção e procure sentir tudo na pele.

Confesse... a praia nunca mais será a mesma.

Jose Carlos Filizola

Rio, outubro 2002

4 comentários:

  1. muito bom, zé! bela idéia. o walter não está exagerando tanto quanto vc diz não.
    abraço.

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  2. sensacional, Zé.
    de uma intensidade ímpar.

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  3. Zé!

    Que prazer ler você, mago das transformações das palavras em sensações.

    bjs
    Lili

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  4. Zé, eu é que nunca mais serei a mesma depois de ler este texto magistral, que merecia estar publicado em livro, que eu invejo não ter escrito!

    Delicadeza, imaginação, sensualidade, uma ode à natureza amorosa da sua escrita imagética.

    Pude ler e ver você e todos os seus elementos e formas em cada linha.

    Talento múltiplo...Quero ver impresso!

    Fatinha

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